sábado, 12 de março de 2011

Doença holandesa


Leia esse texto do jornalista Carlos Tautz, que lembra o alerta de Lula sobre a venda do petróleo do Pre-Sal. O ex-presidente defendia a venda com valor agregado, dos seus subprodutos, e não somente do óleo crú, como quer os EUA. A visita de Barack Obama vem tratar - especialmente - desse assunto.

Doença holandesa é um termo usado pelos economistas que significa quando um país se desindustrializa depois de priorizar apenas a exportação de comodities (mercadorias) sem diversificar sua base industrial, causado no fim o esfacelamento da indústria do país devido a alta valorização da sua moeda. Isso aconteceu na Holanda e vem ocorrendo nos países do Oriente Médio produtores de petróleo.

Cuidado, Dilma!


Obama e o perigo da Doença Holandesa no Brasil


Sem dar mais detalhes, o Ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, informou que, durante visita a Brasília (dia 19) e Rio (20), Obama negociaria a compra de parte importante do petróleo do pré-sal. No longo prazo, o objetivo dos Estados Unidos seria fazer do Brasil o substituto dos instáveis países do Oriente Médio na condição de principal exportador de óleo aos EUA. Mesmo que ainda por ser confirmada, esta é uma notícia que, dependendo dos olhos de quem a lê, já traz embutida uma enorme interrogação. Pode ser o prenúncio de futuro, no mínimo, incerto para o Brasil.


Alimentada por visões de curto prazo, essa diplomacia comercialista vê na estabilidade política do Brasil do pré-sal uma vantagem a ser oferecida aos EUA, devorador radical de combustíveis fósseis, que só teria a ganhar com uma fonte energética que não lhe aprontasse surpresas. Afinal, o mercado americano quer se livrar dos problemas que enfrenta com suas importações petrolíferas, sempre ameaçadas por convulsões em países árabes e muçulmanos ou pela eventual mudança de orientação política, como na Venezuela nacionalista de Chávez. Daí o interesse de se apresentar à Casa Branca como fornecedor seguro de óleo que nunca se daria a arroubos de desafio ao hegemon mundial.


A oportunidade de fazer caixa com a venda de petróleo crú do pré-sal cairia como uma luva numa estratégia mais ampla, de cooperação contínua com Washington, a despeito de representar um claro antagonismo com a promessa oficial, repetida no governo Lula, de agregar valor ao petróleo aqui e só depois exportar. Além disso, a nova posição brasileira, se confirmada, desconheceria a experiência histórica de outros países exportadores de petróleo, como os do Oriente Médio, que também só miraram no curto prazo e até hoje permanecem submetidos a uma pirâmide social com pouquíssimas chances de ascensão.


Esses países frearam seu próprio desenvolvimento ao se viciarem nos ganhos imediatos de um petróleo com ciclos de alta e baixa e não diversificaram sua estrutura produtiva. Contraíram variações da chamada “Doença Holandesa”, fenômeno econômico segundo o qual a especialização em commodities geraria uma apreciação do câmbio e a consequente queda nas demais exportações, levando à desindustrialização.


É algo mais ou menos parecido com o que vivem Arábia Saudita, Irã, Iraque e Líbia, que vendem quase que exclusivamente petróleo e perderam as condições e o interesse em diversificar suas exportações. Não por acaso, esses são países que também vivem sob ditaduras vertebradas por interesses americanos e europeus, aboletadas nas facilidades geradas pela entrada rápida de petrodólares, e sem qualquer transparência na utilização da renda do petróleo. Regra geral, a fortuna produzida pelo óleo é toda apropriada por frações das suas sociedades e produz pouco benefício social.


Antes de confirmar a intenção de comprometer o petróleo em bruto com os EUA, a diplomacia comercialista brasileira, e os interesses privados por trás dela, precisam ter claro todas as consequências desse tipo de relação com o país hegemônico. Principalmente pelo fato de ela envolver o energético que é o insumo vital para os EUA. Um país que, como a história demonstra, não vacila quando quer manter abertas as torneiras de onde jorra o petróleo que os alimenta.



Carlos Tautz é jornalista

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